quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

O CARNAVAL CHEGANDO...



O Carnaval está chegando e o momento é de descontração. Por alguns dias, as obrigações sociais serão esquecidas e “brincar”, como se dizia antigamente, é o que vai interessar aos foliões. Cada pessoa tem seu modo de brincar, condicionado por seus usos e costumes, que nem nessa ocasião são esquecidos. Habitando uma sociedade contraditória, o brasileiro vai para o Carnaval também com Deus, não só com o diabo.


Para grande parte das pessoas, pesa ainda nossa cultura judaico-cristã. Com o tempo, ela se confundiu com outras vertentes e, hoje, temos um sincretismo. Não há religião pura. A repressão se esvai e vão se infiltrando novos hábitos, em práticas sexuais anticonvencionais, como os clubes de swingers (troca de casais) muito na moda e nem tanto “naturais” como se fazem crer, pois a sexualidade é vivenciada antes como hábito de consumo do que como filosofia de vida.



As atitudes sexuais de cada época são ditadas pelo prazer, nada mudou. O indivíduo agora é prático e vale tudo, mantendo certos limites. Mas não vale, por exemplo, fazer todo o sexo do mundo sem proteção, embora o seja feito. Não vale consumir ecstasy, ácidos e muito álcool em boates ou lugares públicos, dirigir embriagado, mas essas coisas também são feitas. A sociedade coíbe essas transgressões, mas valem os novos costumes, como os casais se permitirem pequenas traições, no Carnaval e em qualquer tempo. Mas o Carnaval não muda nada na vida, a vida é que muda.

ENTÃO, ATÉ QUE ENFIM É CARNAVAL!!!!!

No Brasil, ao contrário do que acontece nos outros países, o Carnaval tornou-se um acontecimento de proporções gigantescas, envolvendo muito dinheiro e de grande importância no calendário internacional. Fugiu bastante daquela manifestação do delírio coletivo, do desabafo erótico popular e do humor ingênuo das multidões que saiam às ruas para cantar ou gritar as suas dores e alegrias, para atender a outros megainteresses como os econômicos e de consumo os quais se utilizando dos meios de comunicação, passam a usar descaradamente o sexo como engodo. Juntando-se a isso o álcool e as drogas para um vale tudo sexual. Mas por que essa liberalização outorgada dá tão certo?



As instituições se não adotaram o Carnaval, toleram-no com certa benevolência e já esperam, todos os anos, pelas curiosidades, extravagâncias e escândalos. A função delas é inegavelmente ditar uma cultura repressiva que investe na culpa e sobrevive sob o manto pseudoliberal, relaxando no Carnaval o seu enfoque restritivo mais abrangente que é sobre a sexualidade. Nos dias de hoje, a sexualidade adquire a importância dos grandes temas políticos ou existenciais. Ela estende ao próprio corpo a busca por liberdade e justiça. A tentativa de se padronizar formas saudáveis de se viver à sexualidade é a continuação da interferência na vida privada pelos mecanismos de repressão que regem a nossa vida social. Há grandes interesses em que os “corpos” fiquem fechados ao prazer sexual.



Toda repressão psicológica estabelecida serve frequentemente para atender a motivos políticos. Lembremos Orwell que, no seu livro “1984”, fez uma leitura muito talentosa sobre os interesses do Estado. Naquele, esses são no sentido de que seus cidadãos internalizassem a repressão, como forma de esmagamento de suas condições humanas, decorrendo daí passividade e conformismo que não colocassem em risco o estabelecido. No livro, o fascismo e a sua rigidez têm seus alicerces também fundamentados na extrema repressão sexual.



O Carnaval, assim como o é permitido anualmente, pode ser visto simbolicamente como uma batalha coletivizada (in)consciente, manifestada numa folia sexualizada que expande, em três dias, a luta contra o autoritarismo e as formas de controle sociais. Essa batalha revolucionária, sutil, sem violência e não tão visível, manifestada através do erotismo torna-se, então, uma forma de transgressão dos interditos, um contra-controle anual indispensável para uma vida melhor. Sabemos que a sexualidade é uma energia violenta e mobilizadora e, uma vez que todos a têm como realização pessoal intrínseca ou como, por vezes, um problema a tratar, vivê-la na forma em que se apresentar é abrir um sinal verde para a vida e caminhar para a utilização de todas as capacidades que estamos dotados por nossa condição humana para tal.



Sartre considerou a própria sexualidade como sendo uma estrutura fundamental da existência, por ser essa sinônimo de vida. Portanto, é vital, natural e espontânea no ser humano. Todas as especulações, todos os arranjos hábeis da censura institucional visando impedi-la ou contê-la constantemente, para a submissão e como forma de energia canalizada para o trabalho, para ordem e o progresso, são insustentáveis nas suas formas e nos seus conteúdos. Por isso, curiosamente, acontece o Carnaval.

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